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Plano de vacinação contra a Covid-19 coloca governo sob suspeita de fraude

O governo federal entregou neste sábado (12), ao Supremo Tribunal Federal (STF), o plano nacional de imunização contra a covid-19. O documento foi entregue pelo advogado-geral da União, José Levi, ao ministro Ricardo Lewandovski, relator das ações que tratam da obrigatoriedade da vacina e outras medidas de combate à pandemia.Plano de vacinação contra a Covid-19 coloca governo sob suspeita de fraude 1Plano de vacinação contra a Covid-19 coloca governo sob suspeita de fraude 2O que deveria ser motivo de alívio, contudo, rapidamente tornou-se motivo de preocupação.

Fraude

Logo após a divulgação do plano, Batizado de Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19, surgiu uma grave acusação: o grupo de pesquisadores que atuou na consultoria da elaboração do documento afirmou em nota não ter sido consultado na sua redação final.

“O grupo técnico assessor foi surpreendido no dia 12 de dezembro de 2020 pelos veículos de imprensa que anunciaram o envio do Plano Nacional de Vacinação da COVID-19 pelo Ministério da Saúde ao STF. Nos causou surpresa e estranheza que o documento no qual constam os nomes dos pesquisadores deste grupo técnico não nos foi apresentado anteriormente e não obteve nossa anuência”, diz trecho da nota divulgada pelo grupo de pesquisadores.

Em sua conta do Twitter, a dra. Ethel Maciel, Professora e Epidemiologista da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e uma das participantes do grupo, se mostrou surpresa com o documento. “Nós, pesquisadores que estamos assessorando o governo no Plano Nacional de Vacinação da Covid-19, acabamos de saber pela imprensa que o governo enviou um plano, no qual constam nossos nomes e nós não vimos o documento. Algo que nos meus 25 anos de pesquisadora nunca tinha vivido!”, lamentou.

O uso não autorizado da assinatura ou mesmo os nomes dos pesquisadores sem sua autorização ou conhecimento configura crime, na avaliação de advogados ouvidos pelo Vocativo.com. “Caso tenha acontecido o crime de falsificação de documento público, ocorre o crime previsto no Art. 297 do Código penal, com pena de 2 a 6 anos de prisão, que aumenta em 1/6 se a prática ocorreu por funcionário público”, avalia a jurista e advogada criminalista mestre em Direito Penal, Jacqueline Valles.

Com esse ato, o governo Bolsonaro também passa a ser suspeito do crime de falsidade ideológica (Art. 299 do Código Penal). Segundo a lei, é crime omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante.

“Considerando esse como um documento oficial do governo, deve-se pressupor que essas pessoas autorizaram a inclusão dos seus nomes nele. Ou seja, que ele foi feito com a participação conjunta desses 36 cientistas. Ao lançarem uma nota dizendo que não viram e não autorizaram a juntada desse documento e que as diretrizes que eles firmaram sequer foram seguidas, então o documento apresenta algo que não corresponde à verdade segundo os próprios cientistas”, alerta Yuri Carneiro Coelho, advogado criminalista, Doutor e Mestre em Direito Penal pela UFBA.

Yuri também ressaltou outros elementos ainda mais graves nesse caso: “Ou seja, você [no caso, o Ministério da Saúde] altera uma situação de verdade sobre um fato jurídico relevante, que são as considerações dos cientistas sobre o plano de vacinação. Eles inclusive atestam que diversos elementos ali, como a ordem de prioridade, não corresponde às recomendações feitas por eles. E pior: o governo disse ao Supremo que concluiu um plano de vacinação, mas não concluiu da maneira que disse”, explicou.

Quem pode ser punido?

Caso seja comprovada a fraude, resta saber qual autoridade deverá responder por ele. “Caso tenha sido o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, quem juntou os documentos, a responsabilidade recairá sobre ele. Se o documento foi encaminhado em conjunto com o governo federal na figura do presidente Jair Bolsonaro, com ambos assinando o documento, a responsabilidade será tanto do presidente, quanto do ministro”, explicou Yuri.

A partir daí, os desdobramentos acontecem também na esfera política. “Nesse caso, o procurador geral da República, Augusto Aras, deverá instaurar uma investigação e requerer auxílio da Polícia Federal”, explica Jacqueline.

“Envolvendo figuras como o presidente ou o ministro da saúde, dependendo do teor exato do documento, também poderá ficar configurado o ato de improbidade administrativa de quem apresentou informações falsas”, explica Daniel Lamounier, mestre em Direito Constitucional e especialista em Direitos Humanos e em Ciências Jurídico-Filosóficas pela Universidade de Coimbra, Portugal.

Seguindo os trâmites, caberá então ao Congresso avaliar. “Seria possível discutir possível crime de responsabilidade. No entanto, quem estabelece se houve ou não crime é o Senado, após autorização da Câmara dos Deputados para processamento”, afirma Daniel. “Dependendo de quem deu a ordem para a juntada do documento, pode configurar sim, crime de responsabilidade e culminar em julgamento de impeachment”, afirma Yuri Coelho.

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Vítimas da violência psicológica encontram resistência para denunciar crimes

*Matéria Publicada originalmente nos portais São Joaquim Online, Jornal Sudoeste, Patricio Nunes, Portal Sete, Portal Mirt, Blog Jornal da Mulher, Bahia Extremo Sul, Ver-o-fato e Lex Prime.

Milhares de brasileiras ainda enfrentam barreiras na Justiça e na Polícia para denunciar violências que não deixam marcas visíveis no corpo. Apesar da lei nº 11.340, conhecida como Lei Maria da Penha, definir de forma clara o que é a violência psicológica no Artigo 7, as vítimas ainda encontram resistência para denunciar agressores e conseguir medidas restritivas.

O artigo explica que a violência psicológica é qualquer conduta que cause dano emocional, diminuição da autoestima, prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar as ações, comportamentos, crenças e decisões da vítima, “mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação”. “Apesar de detalhar o que é a violência psicológica, muitas vezes a vítima não consegue registrar um boletim de ocorrência ou conseguir uma medida protetiva para manter o agressor longe”, completa a jurista e mestre em Direito Penal, Jacqueline Valles.

Pior que isso, explica a criminalista, são as consequências que recaem sobre a mulher quando ela decide denunciar este tipo de crime. “Muita gente não entende que a violência está além da agressão e enxerga os agressores como homens acima de qualquer suspeita porque simplesmente não batem em suas companheiras. Uma das minhas clientes perdeu o emprego depois que denunciou os abusos psicológicos que sofreu do marido durante anos de convivência”, conta.

O médico homeopata e doutor em psicologia clínica Eduardo Goldenstein vai além e diz que o abuso psicológico pode adoecer a vítima. “A violência também está nas palavras e ações que visam desmerecer a mulher, nas críticas que diminuem a autoestima e nas ofensas que a desrespeitam e a colocam numa condição inferior ao homem. O machismo manifestado dessa forma, objetificando a mulher, pode levar à depressão, causar quadros de angústia e medo. E isso pode provocar disfunções e outras doenças porque o corpo e a mente estão interligados”, explica.

Goldenstein conta que essas agressões psicológicas podem se manifestar não somente em reações psíquicas (ansiedade, medo, angústias, neuroses, psicoses e depressões – levando inclusive a pensamentos suicidas) como também em distúrbios como cefaleias crônicas, hipertensão, dores crônicas, distúrbios digestivos, respiratórios e outras doenças decorrentes de baixa imunidade. “Cada organismo reage de uma forma, há mulheres que podem sofrer desmaios, ter palpitações. E essa carga grande de estresse, medo e angústia reduz a imunidade das pessoas, que ficam mais suscetíveis ao desenvolvimento de doenças”, observa o médico.

Por isso que a criminalista orienta as mulheres vítimas de violência a procurar ajuda profissional para fortalecer a autoestima. “Muitas vezes elas chegam desgastadas e perdidas no meu escritório. Estão querendo se livrar dessa situação, mas não se sentem fortes o suficiente, então recomendo que busquem, em primeiro lugar, ajuda profissional para se fortalecerem”, conta.

A jurista defende que sejam feitas campanhas de educação e orientação para coibir este tipo de abuso e para mudar a forma de pensar a violência contra a mulher na nossa sociedade. “É preciso dar mais visibilidade a essa forma de violentar mulheres para que as vítimas se sintam encorajadas a denunciar e para que a Justiça seja mais enérgica com o assunto. Enquanto o agressor contar com a certeza da impunidade, essa situação não mudará”, opina Jacqueline.

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Ex-PMs presos em SP serão transferidos para cadeias comuns consideradas seguras

O anúncio foi feito pelo governo do estado. O Tribunal de Justiça Militar decidiu que todo agente que não pertencer mais à Polícia Militar deverá ser retirado da unidade especial Romão Gomes. Advogados e especialistas observam a medida com preocupação.

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Mandar ex-policiais para prisão comum é sentença de morte

*Publicado originalmente nos portais TudoRondonia.com e LagesHoje

A nova instrução normativa do Tribunal de Justiça Militar (TJM) de São Paulo, determinando que policiais militares condenados por crimes comuns e que foram demitidos ou expulsos da corporação cumpram pena em presídios comuns, coloca em risco a integridade física desses presos, ignorando o princípio da humanização previsto na Lei de Execução Penal (LEP). “Além de garantir seus direitos fundamentais, a LEP, de 1984, determina que todo cidadão que esteja sob a tutela do Estado tenha sua integridade física protegida e o direito à saúde assegurado. É uma lei que proíbe a tortura e o tratamento degradante”, observa a jurista e mestre em Direito Penal, Jacqueline Valles.

A criminalista diz que, neste caso, a aplicação da letra fria da lei colocaria em risco a vida de muitos ex-policiais condenados por crimes comuns. “Não se trata de garantir regalias ou benefícios, é uma questão de humanidade não colocar ex-agentes de segurança do Estado nas mesmas celas com criminosos que eles ajudaram a prender. Se isso for feito, o Estado não terá como garantir a sua integridade física, direito amparado por várias leis e pela própria Constituição”, avalia a especialista.

Jacqueline explica que, com base nesse princípio da humanização que norteia a LEP, presos que se declaram pertencentes a esta ou aquela facção criminosa são destinados a alas ou até presídios separados, justamente para evitar confrontos, agressões e assassinatos. “O Estado tem que garantir a saúde e integridade física de todos os presos. Se ele separa os detentos de acordo com a facção criminosa a que pertencem, por que colocaria ex-policiais em presídios comuns?”, questiona.

Antes dessa nova normativa, os policiais acusados de crimes eram mantidos no Presídio Militar Romão Gomes, localizado na Zona Norte da capital paulista. A medida se faz necessária para preservar a vida dos réus, que corre sério risco se forem mantidos no mesmo ambiente em que estão criminosos comuns.

Essa separação encontra amparo legal no artigo 38 do Código Penal, que define que o preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, e no artigo 5 da Constituição, que determina o respeito à integridade física e moral do preso e diz que ele não poderá ser submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante. A jurista explica que, quando há conflito entre o Código de Processo Penal e a Lei de Execução Penal, devem ser seguidos os princípios da Constituição Federal.

Jacqueline Valles é jurista e mestre em Direito Penal

O que muda

A nova instrução, de autoria da Corregedoria do TJM, aponta que, “por questões humanitárias”, o Ministério Público poderá pedir que ex-PMs fiquem no Romão Gomes durante o período de prisão preventiva, mas isso será analisado individualmente pelo juiz militar responsável pelo processo. Mas, após condenação, os ex-policiais deverão ser levados para presídios comuns.

Hoje, policiais que foram demitidos por condenações criminais continuam presos no Romão Gomes. O Código de Processo Penal Militar determina que os militares têm direito a prisão especial antes de condenação definitiva.

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MP-SC nega ter pedido absolvição por ‘estupro culposo’ de Mari Ferrer

O MP-SC (Ministério Público de Santa Catarina) afirmou, em nota divulgada nesta terça-feira (3), que não solicitou a absolvição do empresário André Camargo Aranha por “estupro culposo” — tipo penal inexistente no ordenamento jurídico brasileiro — no processo em que era acusado de violentar a influenciadora Mariana Ferrer em um beach club de luxo na praia de Jurerê Internacional, em Florianópolis, no dia 15 de dezembro de 2018.

“A 23ª Promotoria de Justiça da Capital, que atuou no caso, reafirma que combate de forma rigorosa a prática de atos de violência ou abuso sexual, tanto é que ofereceu denúncia criminal em busca da formação de elementos de prova em prol da verdade. Todavia, no caso concreto, após a produção de inúmeras provas, não foi possível a comprovação da prática de crime por parte do acusado”, destacou o comunicado do MP-SC.

O juiz Rudson Marcos, da 3ª Vara Criminal de Florianópolis, considerou as provas apresentadas como insuficientes e baseadas apenas na palavra da vítima para condenar o empresário por conduta dolosa (intencional). “Melhor absolver cem culpados do que condenar um inocente”, disse.

“Assim, diante da ausência de elementos probatórios capazes de estabelecer o juízo de certeza, mormente no tocante à ausência de discernimento para a prática do ato ou da impossibilidade de oferecer resistência, indispensáveis para sustentar uma condenação, decido a favor do acusado André de Camargo Aranha , com fundamento no princípio do in dúbio pro reo”, escreveu o juiz em seu despacho.

A jurista e advogada especializada em Direito Penal e Criminologia Jacqueline Velles confirma que não poderia haver uma condenação por estupro culposo, pois o crime só existe na forma dolosa. “O que surgiu foi a falta de certeza que ele não agiu com prudência ao verificar que a moça estava alcoolizada, fora das suas capacidades mentais”, completou.

CNJ investigará juiz

O comportamento do juiz Rudson Marcos será investigada pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça”, especialmente pela forma como se postou diante das falas do advogado do réu, Cláudio Gastão da Rosa Filho, sobre a vítima. A OAB-SC (Ordem dos Advogados do Brasil de Santa Catarina) cobrará esclarecimentos por parte do criminalista.

O MP catarinense também enfatizou que promotor de Justiça destacado para acompanhar o processo interveio em favor da vítima em outras ocasiões ao longo do ato processual e como forma de cessar a conduta do advogado durante a audiência criminal.

CNJ avalia investigar juiz que aceitou tese de ‘estupro culposo’
‘Estupro culposo’: absolvido é filho de advogado que representa Globo
“O Ministério Público também lamenta a postura do advogado do réu durante a audiência criminal, que não se coaduna com a conduta que se espera dos profissionais do Direito envolvidos em processos tão sensíveis e difíceis às vítimas, e ressalta a importância de a conduta ser devidamente apurada pela OAB pelos seus canais competentes.”

Críticas
A conclusão do processo e a postura do advogado do réu geraram críticas de especialistas e revolta das redes sociais. Usuários criaram a hashtag #justiçapormaribferrer e o assunto esteve nos trending topics do Twitter no Brasil ao longo do dia, assim como o nome da vítima e a expressão estupro culposo (não intencional).

Para a delegada Raquel Kobashi Gallinati Lombardi, presidente do Sindpesp (Sindicato dos Delegados de Polícia de São Paulo), a dignidade da pessoa humana é, muitas vezes, interpretada tão somente em benefício do acusado. Porém, o conceito precisa ser aplicado de forma mais abrangente às vítimas e é necessário haver respeito principalmente por aqueles que trabalham no sistema de justiça criminal.

“Chamou a atenção o massacre, a forma repugnante como a vítima foi tratada pelo advogado do réu na audiência. Em criminologia denomina-se vitimização secundária, aquela causada pelas instâncias formais que detêm o controle sobre o âmbito social, ocorre justamente no curso do processo penal. O desrespeito às garantias e aos direitos fundamentais das vítimas de crime, presenciada pelo juiz e pelo promotor e nada fizeram além de sugerir um copo de água. Foi um estupro contra a honra da vítima”, classificou a delegada Raquel Kobashi Gallinati Lombardi.

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Polêmica sobre vacinação no Brasil atravessa séculos

*Matéria publicada originalmente nos portais Agora-TO e Blog do Patrício Nunes

A discussão sobre a obrigatoriedade da vacinação, em meio a uma pandemia que já matou mais de 157 mil brasileiros e infectou pelo menos outros 5,4 milhões, está na pauta dos brasileiros, da imprensa e chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF), que deve analisar ainda este ano se os pais podem deixar de vacinar os filhos. O recurso tem origem em ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público de São Paulo contra os pais de uma criança, adeptos da filosofia vegana, para obrigá-los a regularizar a vacinação do seu filho.

O assunto é polêmico e não faltam leis para serem analisadas. A Constituição Federal, em seu artigo 5º, garante direitos individuais, mas também delimita o alcance desses direitos ao bem-estar da sociedade. “Nenhum direito é absoluto. As pessoas não têm uma liberdade de forma ampla. A liberdade vai até o momento em que sua decisão esbarra nos direitos dos outros. Então, durante uma pandemia, algumas de nossas liberdades individuais tiveram que dar espaço para garantir a saúde pública”, afirma a jurista e mestre em Direito Penal, Jacqueline Valles.

Jacqueline avalia que, apesar de aparentemente simples, a decisão do STF tem que ser fundamentada de forma que não haja desrespeito a nenhum direito que está sendo discutido.

A jurista explica que o Direito usa o método da proporcionalidade para solucionar os conflitos de contrapontos de direitos. Esse método se aplica em três teses: adequação, necessidade e proporcionalidade. “No caso da vacina, se discutirá se é adequado, para a erradicação da doença, que se obrigue as pessoas a tomarem vacinas, mesmo contra a sua vontade. Se a resposta for sim, avalia-se se é necessário obrigá-las a se vacinarem para interromper a transmissão. E a última análise considera se é proporcional restringir o direito em nome da saúde pública”, acrescenta Jacqueline.

O fato é que a discussão, a polêmica e a disseminação de boatos sobre a vacinação não é coisa dos tempos atuais. No Brasil, o uso de vacina contra a varíola é obrigatório desde 1846, mas o governo teve que criar uma nova lei em 1904 porque a anterior não era cumprida. “Quando tivemos a Revolta da Vacina, em 1904, havia boatos sobre efeitos colaterais de que quem tomasse a vacina ficaria com as feições de boi. O governo usou o Exército para garantir a imunização, editando inclusive uma nova lei, e o resultado foi um levante popular. Décadas se passaram e a desinformação e disseminação de notícias falsas sobre as vacinas continuam convencendo parte das pessoas de que elas são nocivas, por isso a resistência. Mas é preciso observar que não faltam leis que tornam obrigatória a vacinação para controle de doenças”, completa a jurista.

Além da normativa de 1904, em 1975, durante o governo Médici, foi editada a lei 6.259, que determinou a obrigatoriedade da vacinação. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) também tornou a vacinação obrigatória e, neste ano, o presidente Jair Bolsonaro sancionou a norma 13.979, que dispõe sobre as medidas de combate à pandemia, como o isolamento social e a vacinação obrigatória. “O que não faltam são leis tornando obrigatória a vacinação. O descumprimento implica em perda de direitos. Por exemplo, pais que não vacinarem os filhos não podem matriculá-los em escolas da rede pública”, finaliza a jurista.

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Mudanças na Lei contra a lavagem de dinheiro

O Programa Alesp Conecta, realizado de forma virtual pela Rede Alesp, recebe como convidada Dra. Jaqueline Valles, advogada criminalista, para falar sobre Mudanças na Lei contra a lavagem de dinheiro.

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Afinal, por que é preciso mudar a Lei de Lavagem de Dinheiro?

A Câmara dos Deputados instalou uma comissão de juristas para elaborar um anteprojeto de reforma da Lei de Lavagem de Dinheiro, de 1998, com a participação de 19 integrantes, entre magistrados, membros do Ministério Público, Supremo Tribunal de Justiça e especialistas. Mas, afinal, por que é preciso modificar a Lei 9613/98? A jurista e mestre em Direito Penal Jacqueline Valles defende a reformulação e diz que algumas distorções em decisões judiciais, confundindo lavagem de dinheiro com outros desvios financeiros, tanto em âmbito particular, quanto em campanhas eleitorais, reforçam a necessidade de aperfeiçoar a norma.

Segundo Jacqueline, por causa dessa ‘confusão’, algumas decisões entenderam que o crime popularmente conhecido por Caixa 2, e o crime de falsidade ideológica, poderiam ser integrados com a lavagem de dinheiro, que tem uma pena maior, de até 10 anos de reclusão.

A mestre em Direito Penal explica que a lavagem de dinheiro é um ato no qual a pessoa dissimula ou oculta a origem criminosa de um valor para dar uma roupagem lícita e apresentar no mercado de forma clara. “Muitas decisões, inclusive na Operação Lava Jato, fizeram com que alguns membros do Poder Judiciário entendessem que crimes de falsidade ideológica, previsto no artigo 299 do Código Penal, fossem caracterizados como lavagem de dinheiro. Mas são atos distintos. Há uma diferença enorme entre falsificar a verdade em um documento e dissimular a origem criminosa de um valor. Mas como o crime de lavagem de dinheiro tem uma pena mais grave, de 3 a 10 anos de reclusão, para dar uma resposta aos anseios da sociedade por punição à corrupção, passou-se a entender que a falsidade ideológica era considerada lavagem de dinheiro. É isso que precisa ser corrigido”, avalia.

Jacqueline diz que o crime de lavagem de dinheiro é muitas vezes invocado também para tipificar um crime eleitoral, previsto no artigo 350 do Código Eleitoral. “Esse artigo diz que a omissão ou declaração falsa em algum documento público com fim eleitoral é crime. Neste caso, a pena e de até 5 anos de reclusão. Se o documento for particular, cai para 3 anos, uma pena relativamente branda. Ocorre que, novamente, o Judiciário, atendendo a um apelo popular, passou a considerar este crime eleitoral como lavagem de dinheiro”, completa.

Para que não haja mais ‘confusão’, defende a jurista, é preciso reformular a Lei 9613 para que ela limite e conceitue de forma muito mais segura o que é a lavagem de dinheiro. Isso permitirá que ela não seja aplicada de forma subsidiária para tentar impor a pena mais gravosa. “Não podemos atender aos anseios do povo ignorando as leis ou escolhendo esta ou outra para que a pena seja maior. É preciso seguir a norma. Se ela dá margem a outras aplicações, a solução é passar por uma atualização”, argumenta a criminalista.

Jacqueline é taxativa ao afirmar que a mudança não provocará o afrouxamento no combate ao crime, nem beneficiará os criminosos com a impunidade. “Não vai haver uma insegurança, nem deixaremos de punir os criminosos. O que vai acontecer é que cada ato terá a punição adequada à lei e não será possível encaixar alguns atos de acordo com as penas que forem mais graves, não respeitando aí o princípio do crime”, finaliza a jurista.

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Início de campanha eleitoral neste domingo (27) mobiliza partidos

* Matéria publicada originalmente nos portais R7, Novo Extra, Guaiba, Acontece no RS, TVGC, Blog do Riella, Expresso do Este, Correio do Povo, G7 Salgueiro, Midiacom News, Tudo OK Noticias, Nas Noticias, Araraquara 24 Horas, Radio Santa Cruz, AU Online, Radio Aratiba.

A largada para a campanha dos postulantes aos cargos de prefeitos, vice-prefeitos e vereadores nas eleições municipais de 2020 será dada neste domingo (27), conforme prevê a resolução do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) que libera a propaganda eleitoral.

A partir desta data, podem ser distribuídos santinhos, folhetos, volantes e outros impressos. Porém, o material deverá ser editado sob a responsabilidade do partido político, coligação ou candidato.

Estão proibidas a confecção, utilização e distribuição por comitês partidários — ou com a sua autorização — de camisetas, chaveiros, bonés, canetas, brindes, cestas básicas e outros bens ou materiais que possam proporcionar vantagens ao eleitor.

Já a colocação de mesas para distribuição de material de campanha e a utilização de bandeiras ao longo das vias públicas estão autorizadas pelas autoridades eleitorais, desde que móveis e que não dificultem a passagem de pessoas e veículos. A mobilidade estará caracterizada pela colocação e retirada dos materiais entre 6h e 22h.

Outras estratégias tradicionais, tais como carreatas e o corpo a corpo com os eleitores podem ser comprometidas pela pandemia do novo coronavírus. A crise sanitária provocou o adiamento do calendário eleitoral, remarcado para os dias 15 e 29 de novembro, datas do primeiro e segundo turno, respectivamente.

No entanto, os chamados “showmícios” estão proibidos, assim como eventos assemelhados para a promoção de candidatos e a apresentação — remunerada ou não — de artistas. A restrição não atinge candidatos da classe artística, que poderão exercer a profissão no período eleitoral, desde que não envolva animação de comício, participação em programas de rádio e de televisão ou alusão à candidatura ou campanha.

Punições por desrespeito às regras

A jurista e advogada especializada em direito penal e criminologia Jacqueline Valles ressalta que os candidatos inscritos na disputa eleitoral deste ano devem ter cuidados especiais com dois aspectos muito relevantes para a sociedade nos tempos atuais: a pandemia da covid-19 e as fake news.

O desrespeito às regras sanitárias, como o incentivo à formação de aglomerações de pessoas que facilite a disseminação da doença contagiosa, poderá incidir em punições estabelecidas pela Justiça Eleitoral e pelo Código Penal Brasileiro.

“Se faço algo que infringe essa determinação do poder público, estou inserido no crime do artigo 268 do Código Penal. Então, aquele candidato que desrespeitar, fizer comício, aglomeração de forma desatenciosa nessa determinação [receberá] de um mês a um ano de prisão e multa”, explicou a jurista.

Jacqueline Valles acrescentou ainda que, nessa eleição, o candidato também poderá ser enquadrado pelas autoridades competentes no Artigo 323 do Código Eleitoral (Lei 4737/65) por estimular a desinformação, em caso de conhecimento ou conivência com a propagação de notícias falsas durante a campanha, seja via internet ou mensagem de dados.

“O candidato comete o crime eleitoral do Artigo 323, que pode ter detenção de dois meses a um ano. Independente dos crimes contra honra, [temos] calúnia, injúria e difamação. Esse tipo de atenção que temos que ter nesses dias atuais é de grande relevância, porque ad faked news desrespeitam a sociedade”, afirmou.

A jurista Jacqueline Valles lembrou que o candidato desatento a esse tipo de comportamento poderá prejudicar também o seu partido político. “O seu diretório poderia ser suspento pelo Tribunal Eleitoral [por um período] de seis meses a um ano, se ficar comprovado que essas atitudes maléficas foram feitas sob a sua observação ou sua conivência”, complementou a especialista.

Detalhamento de normas

Mais informações sobre as regras para a propaganda eleitoral podem ser obtidas no site do TRE-SP (Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo). O link com todas as normas é pode ser acessado aqui.

Confira outras práticas permitidas pelo durante a campanha eleitoral deste ano:

Bens particulares — É autorizada a propaganda por meio da afixação de adesivo ou papel, com dimensão de até 0,5 m². Em veículos, são permitidos adesivos microperfurados até a extensão total do para-brisa traseiro e, em outras posições, adesivos até a dimensão máxima de 50cm x 40cm. A propaganda deve ser espontânea e gratuita, vedado qualquer pagamento em troca do espaço;

Comícios — É permitida a realização de comícios e a utilização de aparelhagem de sonorização fixa e trio elétrico entre 8 e 24 horas, com exceção do comício de encerramento da campanha, que poderá ser prorrogado por mais duas horas. O uso de alto-falantes ou amplificadores de som é admitido entre 8 e 22 horas, mantida a distância de, pelo menos, 200 metros de hospitais e casas de saúde, escolas, igrejas, bibliotecas públicas e teatros quando em funcionamento, além de tribunais e sedes dos Poderes Executivo e Legislativo;

Jornais e revistas — O candidato está autorizado a divulgar até dez anúncios por veículo de comunicação social, em datas diversas. O valor pago pela publicação deverá constar, de forma visível. A dimensão máxima do anúncio é um oitavo de página de jornal padrão e um quarto de página de revista ou tabloide. Esse impresso pode ser reproduzido também na internet, desde que no sítio do próprio jornal.

Internet — Também é autorizada a propaganda eleitoral na internet. A liberdade de manifestação do pensamento na rede está sujeita à limitação quando houver ofensa à honra de terceiros ou divulgação de fatos sabidamente inverídicos, inclusive antes de 27 de setembro. É vedado o anonimato e assegurado o direito de resposta. A legislação também admite o uso de mensagem eletrônica.

A propaganda eleitoral na internet pode ser: em sítio do candidato, do partido ou da coligação, com endereço eletrônico comunicado à Justiça Eleitoral e hospedado, direta ou indiretamente, em provedor de serviço de internet estabelecido no país; por meio de mensagem eletrônica para endereços cadastrados gratuitamente pelo candidato, partido ou coligação; por meio de blogues, redes sociais, sítios de mensagens instantâneas e aplicações de internet assemelhadas cujo conteúdo seja gerado ou editado por candidatos, partidos, coligações ou qualquer pessoa natural. Somente candidatos, partidos e coligações podem contratar impulsionamento de conteúdos.

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Portaria sobre estupro viola direito constitucional à dignidade e intimidade

*Matéria Publicada Originalmente nos Portais Ambito Jurídico e Blog Flávia Andrade

A lei que permite à vítima de estupro abortar sem recorrer à Justiça ou à polícia para conseguir autorização foi criada para garantir o bem-estar e proteger essa pessoa da mais cruel violência que se comete contra uma mulher. Mas isso pode mudar com a Portaria 2282, publicada sob a justificativa de ajudar a polícia a identificar o autor da violência sexual. “Na prática, a publicação é uma tentativa de evitar que a mulher exerça o direito legal ao aborto em caso de crime sexual e se configura como uma nova violência contra a mulher, que já foi vítima de estupro”, comenta a jurista mestre em Direito Penal Jacqueline Valles.

A nova determinação do governo federal obriga a vítima a reviver a violência que sofreu, “impondo que o médico promova um interrogatório sobre a dinâmica do crime, sobre as características físicas do estuprador, atribuindo a ele a função de investigador de polícia e o obrigando a acionar as autoridades policiais, sem levar em conta a vontade da vítima”, explica a jurista.

Pela portaria 2282, o médico também será obrigado a fazer um ultrassom para visualizar o tamanho do feto e confrontar com a data em que a vítima relatou ter sido violentada. “Há um constrangimento duplo, tanto para a vítima, quanto para o médico, desvirtuando a sua função que é meramente a de proteger a saúde de sua paciente”, completa Jacqueline.

A lei atual determina que a mulher que for vítima de um estupro e engravidou tem o direito de interromper a gestação. Ela precisa apenas procurar um hospital do Sistema Único de Saúde (SUS), relatar o crime, solicitar o procedimento e ao médico cabe encaminhar para as unidades que realizam o aborto. Se a mulher optar por procurar um médico particular, ela tem que escrever uma declaração de próprio punho, sem a obrigatoriedade de denunciar o crime. “A lei foi construída para simplificar o processo e minimizar o sofrimento da vítima. Ela tem o caráter de protegê-la, sem obrigar que procure a polícia. Muitas mulheres interrompem a gravidez provocada por um estupro sem denunciar o crime”, diz.

A jurista argumenta que, antes de tentar punir o estuprador, é preciso resguardar a mulher e sua dignidade. “Eu tenho que respeitar a vontade da vítima, que está fragilizada, traumatizada e não quer reviver a violência. Mesmo sendo um crime de ação penal pública incondicionada, ou seja, que não depende da vontade da vítima para o Estado agir, é preciso respeitar a vontade dela. E isso acontece com qualquer outro crime. Se a pessoa for roubada, ela não é obrigada a ir à delegacia para relatar o crime. Por que isso deveria ocorrer com o crime de estupro, que é muito mais traumático para a mulher?”, questiona.

A criminalista reforça que a necessidade de cassar e punir os estupradores não pode se sobrepor ao bem-estar da vítima. “Não podemos violentar ainda mais a mulher em nome da Justiça. Além de desumana, a portaria 2282 fere os princípios constitucionais da dignidade e da intimidade. O que se espera da publicação de uma portaria é que ela seja redigida sob a ótica do respeito aos princípios estabelecidos na nossa Constituição e não foi isso que aconteceu neste caso”, finaliza Jacqueline.