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Especialistas afirmam que julgamento de Moro não representa absolvição de Lula

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A Lei de Segurança Nacional e a o bolsonarismo na polícia brasileira

* Matéria Publicada no portal Vocativo

Episódios escancaram o alinhamento das forças policiais com o discurso extremista do presidente
Nos últimos dias, críticos do presidente Jair Bolsonaro (Sem Partido) tem se encontrado sob cerco judicial de maneira inédita. De figuras anônimas ao youtuber Felipe Neto, todos estão sendo alvo da chamada Lei de Segurança Nacional (Decreto-Lei nº 314, de 13 de Março de 1967), alguns inclusive estão sendo presos com base nessa lei.

Felipe Neto com base na Lei de Segurança Nacional por chamar Bolsonaro de “genocida”. Uma liminar na Justiça do Rio suspendeu a investigação da Delegacia de Repressão aos Crimes de Informática contra o youtuber nesta quinta-feira (18/03). No episódio mais recente, no mesmo dia, a Polícia Militar de Brasília prendeu cinco homens por infringir a Lei de Segurança Nacional ao divulgar a cruz suástica associando o símbolo ao Presidente da República.

A maior irregularidade, nesse caso, é que essa lei não poderia só poderia não poderia ser usadas pelas polícias Civil e Militar. “A Lei de Segurança Nacional só importa em crimes federais e quem teria atribuição para investigar seria a Polícia Federal. Cabe salientar que a maioria da jurisprudência entende que a LSN não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988”, explica Ivana David, juíza substituta e membro da Comissão de Direito Penal e Processual Penal do do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

“A LSN é um resquício do regime autoritário que assolou o Brasil. O Ministro da Justiça, de forma açodada, tem determinado a instauração de inquéritos para apurar eventuais crimes praticados contra a figura do Presidente da República. Um inequívoco abuso de autoridade”, afirma Marcelo Aith, advogado e professor convidado na pós-graduação de Direito Militar da Escola Paulista de Direito (EDP).

Esses episódios escancaram o alinhamento das forças policiais com o discurso extremista do presidente. Segundo pesquisa realizada em agosto de 2020 pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que analisou interações públicas em perfis de policiais militares, civis e federais no Facebook, de cada dez praças da PM que usam o Facebook, quatro o apoiam. Desse grupo de baixa patente de policiais militares, 25% apoiam ideias mais radicais, como o fechamento do Congresso e prisão de ministros do Supremo Tribunal Federal.

Diante dessa situação, grupos de oposição ao presidente começam a articular frentes de defesa. O próprio Felipe Neto está organizando um grupo de advogados para defender gratuitamente todas as pessoas que forem investigadas ou processadas por críticas ao presidente. A frente, chamada de “Cala a Boca Já Morreu” será integrada pelos escritórios de André Perecmanis, Augusto de Arruda Botelho, Beto Vasconcelos e Davi Tangerino. Qualquer pessoa que não tenha advogado poderá acionar a equipe responsável pelos encaminhamentos jurídicos por meio de uma página na internet.

Mas qualquer pessoa que sofra tentativa de intimidação por parte de algum apoiador do presidente também pode procurar a defensoria pública do seu estado. “O trâmite é normal. O enquadramento do crime não diferencia a justiça. Qualquer pessoa pode recorrer à justiça contra qualquer acusação”, afirma a advogada Jacqueline Valles é jurista, Mestre em Direito Penal e especializada em Processo Penal e Criminologia.

“O cidadão deve se socorrer de um criminalista de sua confiança, para que tome as medidas judicais cabíveis para o tracamento do Inquerito. Sucessivamente, pode representar a autoridade que determinou a instauração do procedimento pela conduta abusiva”, orienta Marcelo Aith.

Histórico

A Lei de Segurança Nacional, promulgada em 4 de abril de 1935, definia crimes contra a ordem política e social. Sua principal finalidade era transferir para uma legislação especial os crimes contra a segurança do Estado, submetendo-os a um regime mais rigoroso, com o abandono das garantias processuais.

A LSN foi aprovada, após tramitar por longo período no Congresso e ser objeto de acirrados debates, num contexto de crescente radicalização política, pouco depois de os setores de esquerda terem fundado a Aliança Nacional Libertadora. Nos anos seguintes à sua promulgação foi aperfeiçoada pelo governo Vargas, tornando-se cada vez mais rigorosa e detalhada. Em setembro de 1936, sua aplicação foi reforçada com a criação do Tribunal de Segurança Nacional.

Após a queda da ditadura do Estado Novo em 1945, a Lei de Segurança Nacional foi mantida nas Constituições brasileiras que se sucederam. No período dos governos militares (1964-1985), o princípio de segurança nacional iria ganhar importância com a formulação, pela Escola Superior de Guerra, da doutrina de segurança nacional. Setores e entidades democráticas da sociedade brasileira, como a Ordem dos Advogados do Brasil, sempre se opuseram à sua vigência, denunciando-a como um instrumento limitador das garantias individuais e do regime democrático.

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Para advogados, triplicar pena de crimes contra a honra na web é desproporcional

* Matéria publicada originalmente nos portais Conjur, Cajuisticas e Capital do Entorno

Na quarta-feira (17/3), a Câmara dos Deputados derrubou alguns vetos presidenciais à lei “anticrime”. Um dos trechos restaurados prevê a triplicação da pena para crimes contra a honra, como injúria, calúnia e difamação, cometidos pela internet. A validade do dispositivo ainda depende da votação do Senado.

Câmara aprovou aumento da pena de crimes contra honra quando praticados na internetReprodução
Atualmente, as condutas do tipo são punidas com detenção de seis meses a dois anos. Caso a medida dos parlamentares seja confirmada, a penalidade aumentaria para até seis anos. Advogados ouvidos pela ConJur, no entanto, enxergam essa alteração como negativa.

De acordo com Jacqueline Valles, mestre em Direito Penal, amplificar a pena pode ser uma ação autoritária e perigosa para a liberdade de expressão: “Essa pena severa pode ser usada para cercear o direito das pessoas de manifestar livremente suas opiniões. É também um risco à liberdade de imprensa. Há uma desproporção terrível com relação ao que se quer proteger”, alerta ela.

Valles vê uma grande desproporcionalidade no aumento da pena: “Essa é a mesma punição para quem abandonar um bebê e a criança morrer em decorrência do abandono, por exemplo”, destaca. Ela ainda lembra que o Código Penal prevê menos tempo de detenção — cinco anos — para quem machucar uma mulher e, em razão disso, ela sofrer um aborto.

Além de ferir o princípio da razoabilidade com relação aos outros delitos, a medida também é vista como ineficaz pela profissional: “Já é sabido que o aumento da pena não reduz a criminalidade. Os estudos mostram que a educação é a grande responsável por isso”, aponta Valles.

O crimalista Bruno Salles, sócio do escritório Cavalcanti, Sion e Salles Advogados, recorda que a única hipótese de triplicação de pena no CP é no caso de omissão de socorro que resulta em morte.

Para ele, a derrubada do veto, apesar das boas intenções, representaria mais uma deformação no ordenamento jurídico: “Por mais que as relações sociais nos espaços digitais mereçam redobrada atenção do legislador nos dias atuais, triplicar uma pena em razão de o crime ser cometido pela internet não parece obedecer ao princípio da proteção proporcional ao bem jurídico”.

A medida também não se justifica na visão de Adib Abdouni, especialista em Direito Criminal e Constitucional. Segundo ele, o artigo 141, inciso III, do CP já confere a resposta adequada para esse tipo de conduta ao prever o aumento de um terço para crimes cometidos por meio que facilite sua divulgação. “O reavivamento da proposta legislativa original contemplando a cominação de pena em abstrato elevada implica em grave violação ao princípio da proporcionalidade e da ofensividade”, afirma.

Na opinião do criminalista Diego Henrique, associado à banca Damiani Sociedade de Advogados, a derrubada do veto viola os princípios da fragmentariedade e da subsidiariedade: “Tais alterações servirão apenas à perversão dos fins do Direito Penal, passando a funcionar como instrumento de vingança privada ou como mordaça”. Ainda segundo o advogado, “o recrudescimento penal é sempre sinônimo de retrocesso civilizatório”.

Por sua vez, Conrado Gontijo, criminalista e doutor em Direito Penal Econômico pela USP, entende que o sistema jurídico tem dificuldades para responsabilizar os culpados por crimes na internet, mas indica que elas “não resultam propriamente da pouca gravidade da pena prevista para esses crimes, mas dos obstáculos para a identificação de seus autores”. Para ele, “é fundamental também pensar em dotar o aparato estatal de meios eficientes para realizar as investigações, identificar e sancionar os culpados”.