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Lei impede que relatório da CPI seja ignorado pelo MP

Artigo escrito por Jacqueline Valles

O artigo 46 do Código de Processo Penal coloca fim àquela máxima de que uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), no Brasil, termina em pizza. O artigo permite que, se após 15 dias o Ministério Público (MP) e a Procuradoria Geral da República (PGR) permanecerem inertes ao após receberem o relatório da CPI, um advogado legalmente constituído por qualquer cidadão possa ingressar com uma ação penal privada subsidiária da pública e assuma e condução do processo.

Esse instrumento é excepcional, mas de grande valia para a sociedade, pois o direito do cidadão em ter a aplicação da lei penal, inclusive tomando as rédeas da ação criminal se o Ministério Público não agir em tempo, é um direito fundamental da Constituição, conforme o artigo 5º, inciso LIX.

O MP, responsável por denunciar os investigados pela CPI sem foro privilegiado, e a PGR, a quem cabe processar os que têm foro privilegiado, como o presidente da República e seus três filhos, podem até permanecer inertes diante do relatório divulgado pela CPI da Covid nesta quarta-feira, mas isso não significa que o processo pode ficar parado ou esquecido.

Diante do recebimento do documento, os órgãos podem se manifestar determinando a denúncia ou o arquivamento. Se não fizerem nada nesses 15 dias, qualquer pessoa ou entidade pode ingressar com uma ação penal privada subsidiária da pública. Diante disso, o MP ou a PGR pode dar continuidade à ação ou pode acompanhá-la como fiscal da lei.

O CPP garante, ainda, que após os titulares da ação penal publica, ou seja, os representantes do Ministério Publico assumirem o processo, o advogado que entrou com a ação penal privada pode ingressar como assistente de acusação para atuar de maneira autônoma como parte acusadora e pleitear o que entender justo e necessário para o desfecho do processo acusatório.

O relatório final pede o indiciamento do presidente Jair Bolsonaro por nove crimes supostamente cometidos durante a gestão da pandemia (crime de epidemia com resultado morte; infração de medida sanitária preventiva; charlatanismo; incitação ao crime; falsificação de documento particular; emprego irregular de verbas públicas; prevaricação e crimes contra a humanidade). Somadas, as penas chegam a 40 anos de prisão. Outro crime sugerido no relatório é o de responsabilidade (violação de direito social e incompatibilidade com dignidade, honra e decoro do cargo), que enseja a abertura de processo de impeachment.

O documento pede ainda o indiciamento de outras 65 pessoas, entre elas, três filhos do presidente que exercem mandato no Legislativo. O relatório, que ainda precisa ser aprovado no Senado por maioria simples, pede o indiciamento de Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) e Carlos Bolsonaro (Republicanos) por incitação ao crime, conforme previsto no artigo 286 do Código Penal.

Vale lembrar que a CPI não tem o poder de punir os investigados mas, para a Justiça brasileira, o seu relatório equivale ao de um inquérito policial. O Ministério Público e a Procuradoria Geral da República devem analisá-lo, apresentando a denúncia, arquivando o processo ou solicitando investigações complementares, que devem ser feitas pela Polícia Civil ou Federal.

O Código de Processo Penal permite, ainda, que a PGR se responsabilize por todas as acusações, como aconteceu no caso do Mensalão. Nesse caso, todos os réus, mesmo os que não tenham foro privilegiado, poderão ser julgados pelo STF. Para isso, a PGR precisa fazer uma solicitação formal para unir os processos. Se isso não acontecer, cada promotor no seu estado pode ingressar com ações contra os réus individualmente.

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Valles na Imprensa

Lei impede que relatório da CPI da Covid seja esquecido pelo MP

* Matéria publicada Originalmente nos portais O Xarope e Em Pauta Online.

Código de Processo Penal dá prazo para que órgão se manifeste sobre denúncias

O artigo 46 do Código de Processo Penal determina que o Ministério Público (MP) e a Procuradoria Geral da República (PGR) se manifestem sobre o relatório da CPI da Covid no prazo de 30 dias e fornece mecanismos para que as denúncias não sejam automaticamente engavetadas ou ignoradas: a chamada ação penal privada subsidiária da pública.

A jurista e mestre em Direito Penal pela PUC-SP Jacqueline Valles explica que o MP ou PGR podem permanecer inertes, mas isso não significa que o processo pode ficar parado ou esquecido. O MP, que é responsável pelos casos de réus que não têm foro privilegiado, e a PGR, que responde por ações de réus com foro privilegiado, podem se manifestar determinando a denúncia ou o arquivamento. “Se os órgãos não fizerem nada nesses 30 dias, qualquer pessoa ou entidade pode ingressar com uma ação na Justiça, chamada de ‘ação penal privada subsidiária da pública’. Nesse caso, o advogado dessa parte pode assumir a condução do processo. Diante disso, o MP ou a PGR pode dar continuidade à ação ou pode acompanhá-la como fiscal da lei. Se os órgãos oficiais assumirem a ação, o advogado da entidade que entrou com a ação penal privada pode ingressar como assistente de acusação para se certificar de que o processo terá o andamento adequado”, explica Jacqueline.

O relatório final da CPI da Covid apresentado nesta quarta-feira pelo Senado pede o indiciamento do presidente Jair Bolsonaro por nove crimes supostamente cometidos durante a gestão da pandemia. Somadas, as penas chegam a 40 anos de prisão e ensejam a abertura de processo de impeachment.

O documento pede ainda o indiciamento de outras 65 pessoas, entre elas, três filhos do presidente que exercem mandato no Legislativo. O relatório, que ainda precisa ser aprovado no Senado por maioria simples, pede o indiciamento de Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) e Carlos Bolsonaro (Republicanos) por incitação ao crime, conforme previsto no artigo 286 do Código Penal.

Os crimes do presidente

O relatório da CPI pede que o presidente seja indiciado pelos crimes de epidemia com resultado morte; infração de medida sanitária preventiva; charlatanismo; incitação ao crime; falsificação de documento particular; emprego irregular de verbas públicas; prevaricação; crimes contra a humanidade e crimes de responsabilidade (violação de direito social e incompatibilidade com dignidade, honra e decoro do cargo).

Caso a PGR denuncie o presidente por crimes de responsabilidade, ele pode sofrer um processo de impeachment.

Prerrogativas da CPI

A CPI não tem o poder de punir os investigados, mas, para a Justiça brasileira, o seu relatório equivale ao de um inquérito policial. O Ministério Público e a Procuradoria Geral da República devem analisá-lo, aceitando a denúncia, arquivando o processo ou solicitando investigações complementares, que devem ser feitas pela Polícia Civil ou Federal.

O Código de Processo Penal permite, ainda, que a PGR se responsabilize por todas as investigações, como aconteceu no caso do Mensalão. “Nesse caso, todos os réus, mesmo os que não têm foro privilegiado, serão julgados pelo STF. Para isso, a PGR precisa fazer uma solicitação formal. Se isso não acontecer, cada promotor no seu estado pode ingressar com ações contra os réus individualmente”, completa Jacqueline.

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Valles na Imprensa

STF não deve impor prazo para Lira avaliar pedidos de impeachment

  • Matéria publicada originalmente no Portal Jurid

Com mais de 120 pedidos de impeachment contra o presidente Jair Bolsonaro parados há meses na Câmara dos Deputados, à espera de uma avaliação do presidente Arthur Lira, a oposição se mobiliza para tentar fazer com que o Supremo Tribunal Federal (STF) estabeleça um prazo para que os pedidos sejam analisados.
Segundo a jurista Jacqueline Valles, mestre em Direito Penal e professora de Direito, o Judiciário não tem a atribuição legal de estabelecer prazos para a Câmara avaliar projetos e pedidos de impedimentos. “A separação entre os poderes é um dos pilares do estado democrático de direito, decisiva para a harmonia e o bom funcionamento de Executivo, Legislativo e Judiciário. Além disso, o regimento interno da Câmara dá ao presidente da Casa amplos poderes para pautar e avaliar as pautas que lhe são entregues”, explica a advogada.

A Constituição Federal estabelece que o impeachment é um procedimento político parlamentar que precisa ser pautado pela Câmara. Em despacho recente, a Advocacia Geral da União (AGU) já sinalizou que não cabe ao STF definir prazos ou interferir em um processo político. “Diante desse pedido que o PDT fez para que o STF pressione Lira a avaliar os pedidos, a reação natural do Judiciário é negar essa ação. A atuação da Corte Suprema é tão somente a de resguardar as garantias constitucionais de forma e o rito do processo. O STF só poderia ser acionado caso alguns desses processos estivessem em desacordo com a lei”, afirma a mestre em Direito.

O regimento interno da Câmara não estabelece prazos para que o presidente da Casa avalie projetos, portanto, a inércia de Lira na análise dos mais de 120 pedidos não fere as leis e regimento. “Para mudar essa situação é preciso alterar o regimento interno da Câmara de forma que todo o poder não fique centralizado na figura do presidente da Casa. Há mecanismos legais de fazer essa descentralização, mas isso requer mudanças no regimento”, pontua Jacqueline.

*Jacqueline Valles é jurista e mestre em Direito Penal pela PUC-SP