Como a PEC 181 trouxe à tona a questão da criminalização do aborto?

Por Jacqueline Prado Valles*

 

Há algumas semanas, vimos que uma série de protestos foram realizados por mulheres de todo o Brasil contra a aprovação da PEC 181, que aconteceu no último dia 8 pela comissão especial da Câmara dos Deputados. O principal motivo para os atos é que, com as alterações propostas pela comissão, falou-se muito que o aborto poderia ser proibido de maneira generalizada, apesar da Comissão não ter concluído para esse entendimento, a proposta de alteração se faz mais abrangente afetando todos os métodos anticoncepcionais, pois a proteção à vida seria desde da concepção.

A aprovação do texto com tal mudança tomou grandes proporções por dois motivos principais: primeiro, o aborto por si só é um dos maiores tabus em nossa sociedade. Logo, qualquer alteração na lei que envolva essa questão, terá uma grande repercussão. O outro motivo é que, por incrível que pareça, de nada falava o texto inicial da PEC 181 sobre o aborto. A proposta inicial de emenda, de autoria do senador Aécio Neves, propunha a ampliação da licença maternidade para mães de prematuros, de acordo com o número de dias em que o bebê ficar internado, até o limite total de 240 dias. Assim, o desencontro de informações formou uma grande confusão de opiniões e falsos conceitos.

Tal mudança acabou rendendo à emenda o nome de PEC “Cavalo de Tróia”.

O que diz a lei aos casos de aborto antes da PEC 181

Segundo o código penal , há duas maneiras de realizar o aborto sem ocorrer crime: quando não há outro meio de salvar a vida da gestante, e quando a gravidez foi resultado de um estupro. Há, ainda, uma terceira situação onde o aborto é autorizado perante o STF : nos casos em que o feto apresenta má formação no tubo neural. Nessas três ocasiões, a gestante tem a opção de realizar, ou não, o aborto. Caso decida interromper a vida intrauterina, o Estado oferece a opção de realização do procedimento através do Sistema Único de Saúde.

Aborto: uma questão a ser debatida

Como já dito, o aborto é um dos maiores tabus da nossa sociedade. Até mais do que questões como a legalização das drogas. É exatamente por esse motivo que se faz necessário um debate com todos os setores da sociedade – políticos, religiosos, ateus, médicos, ONGs e etc -, antes de qualquer tomada de decisão. A não participação da sociedade, no meu ponto de vista, é o maior erro cometido pelos parlamentares da comissão especial que aprovaram o novo texto da PEC 181.

Apesar do deputado relator Jorge Tadeu Mudaren afirmar, em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo, que a PEC foi discutida durante 6 meses, penso que, no mínimo, deveria ter sido feita uma divulgação maior sobre as audiências públicas de debate, assim como ocorreu em 2012, quando o STF (Supremo Tribunal Federal) convocou toda a população para discutir a autorização do aborto para os casos de anencefalia. Isso vale tanto para as propostas que visam a legalização, como para aquelas que pretendem criminalizar, parcial ou totalmente, a interrupção da gravidez.

Até mesmo porque já existem algumas outras propostas alternativas ante a proibição ou legalização total do aborto, como o desenvolvimento de políticas de redução de danos, aliada as ações de difusão de alternativas ao aborto; informações sobre os métodos utilizados e seus riscos; além da possibilidade de realização de consultas com profissionais de diferentes áreas junto às mulheres. Ou, então, a criação e publicidade de um programa de adoção de recém-nascidos, no qual a gestante que não deseja permanecer com a criança possa ingressar nesse programa de adoção para aqueles que desejam acompanhar e pleitear judicialmente a adoção desde a gestação, evitando assim, a maior parte dos abortos clandestinos que a mulheres acabam cometendo, em razão de não suportarem o nascimento de uma criança não planejada.

A questão principal é que não podemos simplesmente ignorar os dados de saúde pública relacionados os abortos clandestinos e a grande mortalidade dessas mulheres, nem desrespeitar a opinião de grupos conservadores da nossa sociedade. A única e melhor forma de chegarmos a uma conclusão que agrade a todos (ou à maioria) é através de um debate aberto e extremamente esclarecedor para que todos os grupos sociais possam entender e argumentar suas posições.

*Artigo escrito por Jacqueline do Prado Valles, advogada criminalista com mais de 20 anos de carreira e sócio-proprietária do escritório Valles&Valles – Sociedade de Advogados

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